segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

"John Travolta", o Bailarino Falante.

- Mas não cala boca esse animal! - Disse o homem, indicando com os olhos um cão que latia e pulava sem parar, na casa em frente à parada.
Um tanto constrangido, assenti sorrindo, como se o que ele dissera tivesse algum significado pra mim. Já irritado com a demora do ônibus conferi mais uma vez o horário, podendo assim confirmar que de fato havia um atraso. O homem não muito paciente, dava passos curtos, como de quem estivesse dançando.
- Mas que demora, Jesus Cristo, eu tô aqui faz o que? 20 minutos? Nada desse ônibus! Esse horário é normal? - Perguntou o homem em um tom crescente de voz, mostrando total indignação com a demora. Como quem não tinha idéia, conferi novamente o horário e confirmei ao homem que de fato o ônibus havia passado do horário. Fiquei por mais alguns instantes quieto, apenas observando o homem irado, dançando no meio da calçada... - Mas não cala a boca esse animal, percebeu? - Falou o homem, novamente referindo-se ao cachorro. Tenho que admitir que no momento o que eu mais queria era informá-lo que o time dos que não calavam a boca já tinha dois integrantes, mas optei por apenas sorrir e concordar novamente. Já cansado de um cão que não parava quieto, um homem que reclamava de tudo e um ônibus que não chegava nunca, me sentei na calçada, como se não houvesse mais ninguém em minha volta. Um grupo de adolescentes, na maioria do sexo masculino, entrou na rua sendo desde então observado pelo velho bailarino. O homem, agora em um tom zombeteiro, olhou-os até comentar:
- Ah, se fosse no meu tempo... Tu reparou? Elas ali, todas faceiras e os abobados conversando entre eles... Eu já chamava a mais bonitinha... - E por aí o homem foi seguindo, vangloriando-se por sentir-se o John Travolta brasileiro. Mas eu hei de admitir, agora o homem acabara com todo aquele meu semblante tímido e cansado, não pude evitar uma gargalhada desdenhosa.
- E tu, tem namorada? - Foi continuando o homem, ainda se vangloriando por ser "O cara" na adolescência. Novamente frio, respondi negativamente ao homem que não mudara em nenhum instante sua postura de garanhão antes de finalizar:
- Mas dá uns tiros por aí, né?
A primeira reação que tive foi de espanto. Será que esse homem me julgara um marginal apenas por estar cansado ao ponto de me sentar, feito um desabrigado, no meio da calçada? Antes de responder, fiquei alguns longos segundos quietos tentando achar outro significado à palavra "tiro" se não o disparo de uma arma. Até que me veio à cabeça que isso poderia ter algum significado para relacionamentos sem compromisso. - Então...- Deixou escapar o homem, um tanto aturdido pela minha demora. Mas me limitei a apenas rir novamente, deixando assim claro que não havia desejo algum, da minha parte, por aquele assunto. O homem calou-se. Até que o barulho daquele que era o nosso único interesse em comum fez-se ouvir dobrando a esquina. O homem em pulo soltou um grito, agradecendo aos céus, fez sinal pra que o ônibus parasse e assim fomos embora... Agora afastados o máximo possível.



Isso aconteceu já faz um certo tempo, mas tive preguiça de falar a respeito.

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